De onde vem tanta passividade?
Lucy (Emily Browning)é uma garota esforçada. Estudante, faz e aceita todo o tipo de trabalho para conseguir sobreviver. Trabalha num escritório, num café, como acompanhante e garota de programa por fora. Enfim, ela se esforça.
Fria, sempre calada, nada a perturba facilmente. Possui uma passividade com relação à vida impressionante que chega a assustar. Em um dos inúmeros trabalhos que aceita, ela encarna uma mulher praticamente morta. O serviço é o seguinte, por uma quantidade de horas ela ficará sob efeitos de uma droga que a manterá em estado de sono profundo. Nada a acorda. Ao que pagar para tê-la, poderá fazer o que deseja, exceto penetração.
“Beleza Adormecida” é um drama extremamente seco. Sem uma trilha sonora presente no filme, o longa impacta, seja pela história, ou pela sua protagonista, ou mesmo pela total imersão e fora da realidade a qual todos os personagens deste filme estão.
O longa faz uma referência ao conto “Bela Adormecida”. Mas nessa trama não há pureza ou um príncipe encantado. Lucy é posta nas cenas mais humilhantes possíveis. Essa sua paralisia com relação a tudo mostra sua postura diante da vida.
Poucas são as cenas que demonstram sentimentos por parte dela. As únicas envolvem um personagem que não é muito revelado sobre seu passado ou qual é a ligação deste com ela. Esse homem é o único responsável por fazermos perceber que ainda há um pouco de humanidade nessa personagem. Ou seja, que ela é capaz de amar, sofrer ou chorar. No mais, vemos ela andando de um lado para o outro, de um serviço ao outro, trabalhando, se prostituindo e tudo isso com uma naturalidade aterrorizante.
Talvez esse seja o pecado desse drama. Até que ponto podemos nos manter tão distantes e frios diante das circunstâncias da vida ou dos problemas que nos cercam? Lucy é apática, quase invulnerável. Jamais conseguimos compreender seus sentimentos ou que ela esteja pensando. O único momento de calor humano, de dor, raiva, medo e desespero, normal a qualquer pessoa é ao final da trama, mas aí, já somos pegos pelos créditos do final do filme.
O longa recebeu duras e severas críticas devido a forma como foi desenvolvido. A meu ver, toda sensibilidade, empatia e medo com relação a essa protagonista é o espectador quem sente. Vemos o ponto de vista de Lucy, vemos seu mundo, sua vida, mas somos nós que sentimos suas dores e julgamos seus atos. Nós somos seu furor, seu calor, enfim, sua humanidade.
Emily Browning, tão bela e tão fria, está extremamente delicada e profunda. Ela tem um semblante doce, mas ao mesmo tempo distante. Ela de certa forma, quebra com o estereótipo de uma jovem estudante capaz de tudo para se manter numa sociedade cada vez mais obcecada por possuir o que é impossível. Ela não se importa, ela não se choca, nada a toca.
Com um olhar terno e delicado, ela nos encanta e não presa a moralismo, fica nua, é direta e objetiva, transa com quem geralmente não tem ligação, porque assim deseja, porque assim quer.
“Beleza Adormecida” nos mostra uma insensibilidade intensa, sensação essa que causa em que vê ao drama, toda uma carga de revolta e inquietação. Provocante e seco. Diferente e distante.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário