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Corrida Mortal 2050

(Death Race 2050, 2017)
?
Sua nota

Críticas

Cineplayers

Atualização contínua de humor e violência nas estradas

6,5

Após 42 anos do material original Corrida da Morte - Ano 2000 (Death Race 2000, 1975), temos esta espécie de continuação/refilmagem/modernização torta do filme de 1975, que resgata – a sua maneira – o tom de sátira de seu predecessor. Temos de volta os carros com mais personalidade (ao contrário das tentativas de proposições mais a sério dos filmes da cinessérie a partir de 2008), o cinismo político e a manipulação midiática. Cercada por franca e escrachada violência que visa a curtição. Atualizando temas como a proposição da informação e interligação viciada do espectador ao espetáculo. Porém sem o mesmo frescor e charme ignorante do original. Mas tem sua farra como mote interessante.

O truque aqui é atualização de temas, onde os personagens lidam com a intercessão dos espectadores da corrida que participam da mesma através de óculos 3D que emitem sinal do capacete acoplado nos navegadores. Colocar o espectador na proximidade do poder é a intenção. Mais um braço do controle social instigado pelas elites, principalmente porque a alienação é pauta-mor, já que neste futuro os empregos dos cidadãos são inúteis com o desemprego na casa dos 99%. Então seria de bom tom a elite evitar o enfurecimento populacional. Aquela crítica social agarrada ao argumentum ad absurdum para passar sua mensagem. Bem ao estilo do produtor Roger Corman – algo que o mesmo reclamara faltar nas versões dos anos 2000. Ademais a fita segue a narrativa padrão do filme anterior. Um piloto campeão misterioso; um antagonista viciado em derrotar o protagonista Frankenstein; a navegadora de Frankenstein envolvida com a resistência ao sistema que fica num dilema entre seguir seu grupo revoltoso ou ficar ao lado do piloto; um presidente psicótico; a manipulação das massas, etc. Por isto mesmo que a terminologia semântica das palavras “atualização das estratégias” é tão encaixada aqui. Mesmo com as similaridades, o filme busca ter ainda sua própria identidade tresloucada quando aposta ou no erotismo mais gráfico ou então em temas mais incisivos (com humor), como na questão do antagonista Jed Perfectus (interpretado por Burt Grinstead) ser sexualmente indeciso numa primeira camada para se mostrar homoafetivo em seu tesão incompreendido por Frankenstein (Manu Bennett). Daí se tira o caráter sem freios morais deste material.

Sobre atualizações, a violência aqui é descabida mesmo, forçada para o humor absurdo, soando gratuita como deve parecer. Nisso ajuda o lançamento direto para vídeo do material, já que com orçamento limitado a liberdade de ação por sobre temas e narrativas era mais desenvolta. Aí a forçada na brutalidade e no erotismo. Como é de praxe nas fitas de Corman, o exagero serve como mensagem crítica, afinal para ele deve se seguir o esquema de que uma marretada na cabeça é mais funcional que um diálogo. A produção quer se aproveitar do status cult do filme original para divertir e lucrar uma grana com este projeto, obviamente. É rápido, barulhento, sem noção e divertido. Mesmo não tendo o charme e encaixe de trama, personagens e ação do original. Mas isso não importa quando temos gags visuais e narrativas absurdas que inundam a duração da fita na intenção mais objetiva possível em divertir através de sua própria noção de tolice velada. Isto é visto por conta não só das escolhas visuais, mas no traquejo do roteiro para com as decisões e frases proferidas por seus personagens e pela introjeção de seus intérpretes, que parecem estar se divertindo bem neste troço. Como um Malcolm McDowell como The Chairman, que é o líder por trás da Corrida Mortal e que tem um ar burlesco a lá Donald Trump que se regozija pelo empanturrar de desgraças por sobre os alienados, tudo isto para manter vivo seu eterno hedonismo visceral. Tudo regado pela falta de delicadeza da equipe.

O filme tem a proposta tresloucada, e isso acaba sendo um subterfúgio esperto para não se ater a furos ou ataques ao seu caráter simples de junção de elementos e situações. Como a proposta é avacalhada em seu nascedouro, a condescendência vem a reboque com força. Mas mesmo com todos estes elementos, a ação ainda aparece truncada em determinados pontos e alguns conflitos se resolvem de maneira mais avulsa do que poder-se-ia esperar (a trajetória de Jed Perfectus). Mas nada que realmente comprometa a diversão ensejada.

Se o filme de 1975 era uma visão maluca de como poderia ser o ano 2000 mediante os aspectos de sujeira e consciência política satírica e pessimista, neste aqui a linha do que teria acontecido adiante é de acordo com aquele universo proposto anteriormente, somado às indagações contemporâneas até 2017. Mantém a conotação dos abusos e somam a este, camadas de sujeira e vitalidade na selvageria, afinal a consciência dos criadores se mantém em justaposição com a afinidade do público com sangue e tripas, e que agora a tecnologia permite um acesso mais direto a isso. Obviamente que o tom anárquico prevaleceria ao final, numa fita que não busca inventar absolutamente nada além do que quer como curtição imbecil desenfreada, sem amarras e preocupações morais. Existindo como um caos feito com vontade, exagero e falta de escrúpulos, buscando moldar um ideário compulsivo de décadas atrás para o tom contemporâneo repleto de falsos moralismos e de um politicamente correto que é usado tanto de maneira a coibir preconceitos quanto para coibir liberdades artísticas válidas. Nisso o sarro ao aparecer tem não só sua função cinematográfica ao entretenimento, mas, sim, uma irresponsabilidade salutar e gutural que é extremamente necessária tanto à história quanto ao cinema. Irregular, irreverente e existente. Serve.

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