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APE: O Super King Kong

(킹콩의 대역습; King Kong Eui Daeyeokseup, 1976)
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Críticas

Cineplayers

A canalhice eterna de um gorila

10,0

Versão norte-americana/coreana mais calhorda do King Kong e não menos sensacional. Quando Dino de Laurentiis decidira fazer a sua versão do King Kong (King Kong, 1976), atualizando-a para a década de 70, eis que um grupo de fenomenais pilantras se aproveitariam da ocasião pra fazer a sua própria versão, no embalo do primo mais endinheirado. A RKO e a Paramount botaram boneco e não permitiram o uso da nomenclatura “Kong”, mas os caras foram malas e meteram o nome APE, e com direito ao cartaz apontar que APE não era pra ser confundido com KING KONG (em letras garrafais). Essa é só uma das mais variadas malandragens dessa fita.

O material não perde tempo. Pancadaria de começo logo após os créditos aparecerem. O macacão ataca durante uma conversa absurda de dois grumetes do navio, a besta já estava encarcerada nessa embarcação, ou seja, não explica de onde veio ou como fora preso. Parte logo pra destruição. O animal já briga logo com um tubarão – no qual ele (um cara numa fantasia de gorila) movimenta o outro ser sozinho (um bonecão de tubarão) pra emular a briga, que é uma beleza. Todo tipo de truque fajuto nessa fita. Nisso ele parte diretamente para arrasar uma cidade do nada e com o uso do mesmo som de algo sendo quebrado, repetido dezenas de vezes. Dá o gás no desmantelo de cidades de papelão. Mas alopra mesmo. A intenção da produção é apelar para o efeito destrutivo da criatura, moldando o mesmo pelo tamanho do perigo através do sem número de paredes de papelão que ela derruba. Busca uma apelação irrefreável estruturada nessa canalhice.

Tem outro detalhe: Filmado numa parafernália 3d. Manca. 24 mil dólares de orçamento e com o 3D. A tática é meter os planos de câmera com coisas sendo arremessadas ad infinitum pelo gorilão na tela, no objetivo de causar aquele efeito maroto de pertencimento diegético e susto da plateia. Barris, pedras, animais e armas. E é claro que a percepção de tamanho do macaco muda conforme cenas e cenários outros vão perpassando no seu monitor e é óbvio que ele joga uma cobra na câmera. Com flechas jogadas frontalmente também inclusas. São situações picaretas como estas que me trazem o completo tesão por este tipo de esculhambação. É uma visão de cinema baseada no oportunismo e na resistência com base na mais frontal malandragem, escapando como cinema. Mostrando (“monstrando”) a possibilidade de se fazer fitas de monstro, copiando criaturas de orçamento graúdo e causando diversão assim mesmo. Inclusive a intencionalidade do 3d nascera com ideia de apelação e manipulação da plateia, algo que APE explora sempre que possível.

Agora sintam isso: Trilha sonora altamente exagerada e dramática. Cortes bruscos na montagem. Imagem e som interrompidos a rodo e a trilha sonora avulsa aparecendo por um segundo e sumindo em seguida. Gorila taradão destroçador aleatório. O macaco atrapalha gravação de filme de porrada. O faz diversas vezes. O negócio do macaco é atrapalhar cenas de luta sendo filmadas nas quais uma produção está desenrolando. Várias vezes. E ninguém faz nada com o bicho perambulando e demolindo tudo. Subverte o material original em alguns lances. O macaco começa preso, se soltar no mar, e a mulher já é atriz conhecida e fazendo filme. E ela grita que só uma porra.  O som vez por outra é cortado de uma vez pra dar espaço à vozes avulsas e depois volta a trilha abruptamente. Joia. Os militares sem resolver porra nenhuma, e só gritando de seu próprio escritório é um troço altamente verossímil. Repetição de planos (muita repetição) pra demonstrar quantidade de destruição. O que dizer dos soldados aproximando as armas da tela pra causar o efeito 3d quando o montador os deixa pararem propositalmente? Mais demolição de cidades de papelão. Militares reclamando. Produção da fita de ação interna sendo atrapalhada pelo macaco em contínuo desespero. Macaco senta na mata pra olhar o filme sendo feito, e joga pedras na tela. Corta, e aparecem homens lutando em cena dessa filmagem. Atriz beija alguém. Macaco come alguma coisa e joga uma pedra em algum militar... Respirem... Isto é APE. O suprassumo da porraloquice esculhambatória montada da forma mais tresloucadamente picotada quanto fosse possível, unindo ações das mais inverossímeis (fora os militares sendo inúteis) e totalmente nonsenses (no plural estapafúrdio mesmo) que se possa pensar.

Aqui o truque é pela quantidade de ações que possam ser inseridas nas sequências, causar um agito de ritmo na marra pra manter o espectador ligado, que assim o fica por conta do total absurdo que se percebe até ali. Ora, um filme de monstro por si só já tem um altar próprio da suspensão da descrença que visa escolher de início da sua narrativa. APE alopra com tudo isso e parte pra um sarro aberto de tudo sem se importar com qualquer verossimilhança interna que seja possível – algo em conta similarmente pela precariedade de tudo além da pressa para se soltar o material aproveitando do ensejo da produção de Dino de Laurentiis que estava pertinho de ser lançada.

O oportunismo é o esquema deste filme, assim como toda a sua estória contada e a sua história de produção, que abraça fragorosamente a avacalhação como mote primordial de existência. Algo que seu duelo principal explora: APE contra os helicópteros. Com o artifício sonoro dos helicópteros, enquanto voam e quando explodem, serem sempre os mesmos; além da movimentação bizarra e nervosa do macaco que emula uma mistura de humano em estado de algazarra esquizofrênica com a lembrança de ser um gorila. Sem esquecer do ponto primordial desta fita: O macaco destrói mais um helicóptero numa montanha rochosa e manda um dedo do meio erguido na tela. O famoso cotoco, como se diz no Ceará. Não somente como comemoração pela vitória até ali, mas para todos que o assistem do lado de cá. Anarquia pura. APE, o macaco mais vagabundo e escroto do cinema.

Parte do especial Monstruosidades Imensas

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