O poeta da violência representa o seu adeus ao western em uma obra romântica e profundamente marcante à carreira que construiu. Pat Garrett & Billy the Kid (idem, 1973) é uma das mais belas formas de expressões artísticas que o cinema já pôde proporcionar. Impossível imaginar outro diretor que pudesse compreender os anseios que contornam Pat Garrett & Billy the Kid, onde Peckinpah faz genialmente a junção melancólica e nostálgica ao mesmo tempo em que a violência e brutalidade criam, paralelamente, um contraste. Efetivamente o estilo de Peckinpah compõe-se desses contrastes, não à toa o diretor é conhecido como o poeta da violência.
Originalmente escrito por Rudy Wurlitzer, o roteiro do filme foi alterado por Peckinpah a fim de remodelar a relação entre Garrett (James Coburn) e Billy (Kris Kristofferson). Ignorar a amizade entre a dupla faria com que o filme perdesse grande parte do valor sentimental, precisamente detrair essa relação limitaria o filme a uma caçada tão comum como qualquer outro western de meados da década de 50 e 60. A amizade, ainda que estagnada pelo fato de Billy ser foragido e Garrett ter o dever de capturá-lo, tinha valor para os dois.
Podemos dizer que o fator mais marcante no estilo de Sam Peckinpah não é a violência em si, mas a forma tênue que o diretor a usa como uma forma de estilização, explorando ao máximo os detalhes que uma cena pode oferecer. Na verdade Peckinpah é um manipulador da violência, cria uma afluência entre a intensidade realística onde a atmosfera brutal soa mais como uma paisagem sintética ao sangue se esparramar em câmera lenta. Nas mãos de Peckinpah a violência é uma das coisas mais belas já vistas.
Toda essa estilização da violência ganha tom poético e melancólico, representando toda a concepção que o velho oeste simbolizou, com as canções de Bob Dylan. É imponderável o impacto que a estética da cena sofre a vir acompanhado de tais canções, o resultado é algo simplesmente indescritível. A forma como Peckinpah explora a trilha sonora é um dos aspectos que demonstram a completa diferença entre seu estilo e o estilo americano de fazer um western. Peckinpah tinha uma percepção em que a trilha sonora exerce papel fundamental para ampliar o impacto da cena, assemelhando-se mais com o estilo à italiana.
Num contexto geral, a ligação que Peckinpah faz seguidamente em seus westerns funciona como provérbios. Notavelmente uma reformulação na figura do homem adaptando-se ao cenário que lhes convém ocorre em cada um de seus westerns. Sempre com aspectos revisionistas, suas obras apresentam uma tendência de retratar a injustiça sem qualquer ingenuidade. A sua primeira revisão sobre o velho oeste ocorre em Os Pistoleiros do Entardecer (Ride the High Country, 1962) e teria um fim em Meu Ódio Será Sua Herança (The Wild Bunch, 1969), ambos apontando a incerteza moral do homem manipulado pela ambição sádica. O sentimento e moral se confrontam em Pat Garrett & Billy the Kid, em detrimento da dignidade, refletindo o lado metafísico de seus personagens.
Os personagens espelham, em contraposição, o saudosismo e a desmoralização do homem corrompido pelo poder. Peckinpah encerra a sua revisão sobre o velho oeste de forma simbólica e melancólica, com a maestria que o gênero merece. A criança atirando pedras no homem que matou Billy the Kid reflete tudo o que as lendas e o fim de uma era representaram.
É justamente esse contraste de Straw Dogs com os outros filmes do Peckinpah que causa grande impacto. Em momento algum ele diminui a carga, ele alivia, ele estiliza. O cara choca, e não só pela ação na tela, mas pela destruição psicológica promovida pelo suspense cada vez mais crescente a medida em que o filme adentra mais fundo dentro dos seus personagens, revelando a verdadeira violência advinda do homem, onde essa advém dos mais diversos frutos(seja da ignorância,da fraqueza do outro, da necessidade de sobreviver, da vingança, da promiscuidade...) mas com apenas uma linguagem universal, entendida por todo animal, inclusive e principalmente o ser humano. Por isso considero a obra-prima do Peckinpah. Pelo abandono do poético pelo real, não com o intuito de chocar apenas mas de revelar, expor e atestar.
Mas é um filme bom sim, eficiente estudo sobre a natureza da violência nos seres humanos, mas prefiro bem mais a poesia do diretor à sua abordagem realista. Prefiro até o ótimo A Cruz de Ferro, que pode-se considerar uma mistura das duas facetas.
A Cruz de Ferro é ótimo. E é de uma coragem muito grande fazer um filme onde os protagonistas são nazistas.
Ainda não vi A Cruz de Ferro. Também prefiro a forma estilizada da violência com tom poético, mas essa forma mais explícita e realista que Peckinpah traria em Straw Dogs teria uma influência gigantesca na década de 70 sobre os filmes de ação. Mesmo causando tanta polêmica pela cena de estupro, essa própria cena seria a prova definitiva de que Peckinpah sabia como ninguém manipular a violência, seja de forma poética ou realista.