O ano era de 1969, delicado período em que os EUA se encontravam em constantes mudanças políticas e sociais, e com o cinema as coisas não foram diferentes. Os filmes de faroestes não alcançavam o mesmo sucesso de outrora, momentos estes iluminados e protagonizados por hoje, lendas da sétima arte e deste gênero, como os diretores Jhon Ford e Howard Hawks, sem mencionar a estrela máxima deste universo magnífico, Jhon Wayne. A produção deste filme iniciava uma grande parceria entre Eastwood e o diretor Dom Siegel, que duraria inúmeros filmes, onde objetivavam levar as telonas um bang-bang que fosse inovador e buscasse elementos que transmitissem uma magia idêntica aquelas que foram apresentados na era de ouro destas produções. Clint vinha da trilogia homem sem nome de Leone, o que lhe garantia no currículo experiência de sobra com este tipo de personagem. Siegel, raposa velha dos faroestes, capitaneou inúmeras produções de sucesso como Estrela de Fogo, e agora ao lado de Eastwood, pretendia realizar um entretenimento tão excitante quanto aos filmes mais consagrados do gênero. Os Abutres Têm Fome até tenta, é divertido e carismático, porém não consegue escapar da velha fórmula de Hollywood de construir e desenvolver histórias como estas, infelizmente estagnando entre produções comuns do gênero.
Contando com um Morricone menos inspirado na composição das trilhas, a emoção não é a mesma quando se ouvia as poderosas faixas de Por Uns Dólares a Mais e Três Homens em Conflito, o que retira grande parcela de toda a força que determinadas passagens deveriam receber caso a música realizasse seu serviço com maestria e eficiência. Momentos que ficariam na mente do telespectador passam rapidamente, quase despercebidos, como as passagens da explosão da ponte e invasão do forte francês, mais ao final da projeção. Esta característica que falta em Os Abutres Têm Fome não apenas prejudica a aceitação do público em relação aos fatos, bem como a construção de uma empatia mais consistente com os mocinhos. Pelo menos a direção de Siegel continua com criatividade e elementos que conferem fluidez no desenrolar da história, descortinando com calma, detalhes importantes, mesmo que peque profundamente em não iluminar o olhar dos vilões a cerca de tudo o que está acontecendo naquele período no México, bem como a revelação máxima do filme, envolvendo a freira Sarah, onde uma sensação de surpresa se mistura a de frustração, sendo que poderia ter sido melhor trabalhada.
Eastwood fala em 15 minutos o que não disse em três filmes de Leone, o que é um detalhe muito bem vindo, tendo em vista que esta falta de comunicação interfere razoavelmente na criação e manutenção de empatia entre personagem e público. Anteriormente, seu personagem conversava com os olhos, sempre apoiados pela trilha icônica de Morricone, mas aqui desenvolve grandes diálogos, envolvendo muitas tiradas divertidas. Vale lembrar que neste filme, por incrível que pareça, Eastwood não é estrela máxima, e sim a vencedora do Oscar Shirley Maclaine, que se não bastasse ter seu nome creditado em primeiro, rouba todas as atenções da trama, com uma personalidade bastante divertida e duvidosa, protagonizando momentos de muita descontração. A história se desenrola através de sua estranha personagem, que como dito anteriormente, se têm uma revelação bombástica perto da subida dos créditos, mas que não recebe o mesmo grau de importância por parte do diretor, que apenas a desenvolve em um momento sem muito brilho, rápido demais para talvez, o maior mistério do filme.
Os Abutres Têm Fome foi um inusitado título nacional escolhido após, em determinado momento do filme, o personagem de Clint afirmar que os abutres têm fome, aproveitando para questionar a Sarah se seria pecado eles comessem os restos de alguns bandidos, que acabaram de perder um duelo. Caso mantivessem o nome original, que literalmente significa Duas Mulas para Irmã Sarah, ficaria ainda mais adequado dentro da proposta de Siegel, já que o centro da trama se passa através da relação carismática e desajeitada de ambos. Sem fortes emoções ou momentos icônicos, esta produção se junta a uma grande porção de filmes que não conseguiram se ascender entre os maiores nomes do faroeste. A presença de dois nomes de peso não foram suficientes para segurar a barra de uma história superficial, que ao final se torna mais do mesmo. A sensação que impera quando os créditos finais tomam a tela, é a falta de um duelo marcante, daqueles instantes que o público nem pisca ou respira aguardando quem atira primeiro. Infelizmente este filme é carente de momentos assim, mas que consegue mesmo que em menor escala emocional, transmitir diversão e entretenimento. O gênero do faroeste não seria o mesmo a partir da década de 70. Os caubóis mais rápidos do oeste tinham ficado no passado.
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